quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Vende-se em área de risco...

Jornal Cruzeiro do Sul - 

Diante da imposição legal, que preceitua a transparência como princípio da administração pública, a não divulgação das áreas de risco pode ser entendida como omissão



O prefeito Vitor Lippi (PSDB) anunciou na terça-feira, em entrevista exclusiva ao repórter Carlos Araújo, do Cruzeiro do Sul, que pretende levar ao conhecimento da população (possivelmente, através da internet) a localização das áreas de risco mapeadas pela Defesa Civil, como forma de permitir que pessoas interessadas em comprar ou alugar imóveis não se exponham a riscos e prejuízos futuros.

Sorocaba possui 88 áreas de risco, das quais 26 são passíveis de deslizamento, 21 de inundação e 41 de alagamento, conforme detalhou a Defesa Civil dois meses atrás ("Época de chuvas - Áreas de deslizamentos preocupam Defesa Civil", 29/11/2011, pág. A11). No entanto, só raramente os munícipes conseguem apontar mais do que duas ou três dessas áreas, e, ainda assim, sem um delineamento preciso.

A falta de indicações objetivas a respeito dos imóveis sobre os quais pesa algum tipo de ameaça permite que seus proprietários os aluguem ou vendam. "Financiei a casa há dois anos e meio e ainda faltam 22 parcelas de R$ 550 para pagar", desesperava-se o autônomo Sandro Antônio Ribeiro, do bairro de Pinheiros, na última segunda-feira ("Prejuízos - Famílias tentam recuperar o que sobrou", 24/1, pág. A7).

Assim como Sandro, muitos munícipes podem estar ingressando neste exato momento numa das 88 áreas de risco, sem se dar conta dos prejuízos e transtornos que sofrerão. Quem, afinal, alugaria ou financiaria uma residência se soubesse que o local já apresentou inundações ou que as encostas próximas podem ceder, destruindo seu patrimônio e pondo em risco sua família?

Fosse apenas pelo aspecto moral - isto é, pela lealdade e solidariedade que devem pautar a relação entre o poder público e a população -, ou somente pelo dever de responsabilidade que a todos subordina - homens públicos ou não -, no sentido de alertar sobre situações potencialmente perigosas, capazes de colocar em risco vidas e bens materiais, a divulgação das áreas de risco já estaria plenamente justificada.

Trata-se, porém, de uma decisão que vai além do âmbito moral ou da questão das responsabilidades, já que a legislação brasileira impõe, de maneira muito objetiva, os princípios da publicidade (transparência), moralidade e legalidade como obrigações incontornáveis ao poder público. Por força da Constituição e da legislação ordinária, o governante não pode elidir informações essenciais aos cidadãos.

O direito à informação é assegurado pela Lei Maior brasileira, que preceitua em seu artigo 5º, inciso 33: "Todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado."

Diante da imposição legal, que preceitua a transparência como princípio da administração pública, a não divulgação das áreas de risco pode ser entendida como omissão, e os eventuais prejudicados, uma vez que não tenham sido alertados sobre perigos conhecidos, podem inclusive acionar civil ou criminalmente o poder público, caso a ocupação de um imóvel venha a ocasionar perdas materiais ou acidentes com vítimas.

Certamente não faltará quem faça lembrar ao prefeito, à guisa de objeção ou aconselhamento, que a divulgação das áreas de risco causará insatisfação entre os proprietários, já que um dos efeitos previsíveis da medida é a desvalorização imediata dos imóveis. Esse argumento não deve, porém, inspirar mais do que um cuidado redobrado no delineamento das áreas sujeitas a desastres naturais, de forma a evitar que imóveis isentos de riscos sejam nelas incluídos por engano.

Tomadas as precauções necessárias, entretanto, nada deve se opor à divulgação do mapeamento feito pela Defesa Civil, que atende ao mais alto interesse da população e configura, dessa forma, relevante serviço de utilidade pública, de que a Prefeitura não pode nem deve se esquivar.
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